quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

A constante cisão entre local do parto...

Volta e meia acontece um "escândalo" e o tema volta à ribalta. 
Ou porque uma celebridade decidiu parir em casa (e conseguiu, ou então não).
Ou porque alguém (mãe ou bébé) tiveram complicações (leves ou fatais) na tentativa de um parto domiciliar. Aqui estão dois exemplos de 2 casos com desfecho negativo, uma no domicílio e outra no hospital (sim, também há desses no hospital):
http://www.publico.pt/Mundo/australiana-defensora-dos-partos-caseiros-morre-em-casa-apos-dar-a-luz--1532092
http://www.tgcom24.mediaset.it/cronaca/calabria/articoli/1034547/crotone-19enne-muore-dopo-parto-cesareo-denuncia-dei-familiari-tensione-allospedale.shtml

Não vou discutir os casos porque não sou perita em gin-ob. nem tenho acesso a toda a informação.
Mas elevam-se as vozes do costume: umas pró outras contra.  Geralmente estas vozes são radicais porque já sofreram ou rejubilaram com as suas experiências ou com as de alguém próximo.
Ora, casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão.
Sendo o pão neste caso, pães: 
1 - informação sobre a segurança do parto domiciliar assistido, que nos dias que correm é geralmente assistido por profissionais competentes e com os intrumentos e medicação básicos para uma assistência adequada; e desinformação sobre a necessidade de certos procedimentos hospitalares.
 2 -  legislação e rede de suporte no nosso País aos casais que por direito, optam pelo parto domiciliar.  (Para ver se de uma vez por todas, as pessoas param de olhar de lado para quem toma essa decisão e a coisa pára de ser mais secreta que a Maçonaria)...

Hoje em dia penso que deve haver c. de uma dezena de ESMOs (enfermeiros de saúde materna e obstétrica) ou parteiras com outras formações a aceitar assistir os c. de 1% de partos domiciliares que ocorrem anualmente em Portugal (já não sei de onde tirei este valor de 1% mas penso ter sido de um relatório de 2009). Tenho quase a certeza que a ordem dos enfermeiros não reconhece os parteiros que optam por respeitar o casal na opção do parto no domicílio. Limitam-se a fechar os olhos. Assim como a legislação nacional, não determina onde têm que nascer as crianças (e ainda bem: ninguém determina onde as mulheres deverão menstruar ou ter relações sexuais, outras bem conhecidas funções fisiológicas).

Não conheço todos os casais que optaram por um parto domiciliar assistido, mas dos que conheço, nenhum duo mãe-bébé teve problemas, mesmo quando foram transferidos, atempadamente, para o hospital em caso de necessidade.
O parto no domicílio está mais que provado, aqui ou noutra parte do mundo civilizado, como seguro e benéfico para mãe e bébé no quadro de uma gravidez saudável de baixo risco, e deveria ser oferecido aos casais como opção informada na escolha do local de parto. 
Quando um casal opta pelo local do parto, deve ser informado sobre os riscos e benefícios inerentes a cada local. Em qualquer local, há riscos possíveis. Afinal o parto é parte da vida, e a morte inevitavelmente também faz parte da vida, e às vezes nos momentos mais inesperados. Infelizmente não há hoje em dia nenhuma instituição oficial idónea que apresente as diferentes oções aos pais e que discuta os factores decisivos a ter em conta na escolha. Obviamente uma instituição hospitalar vai alegar que ali é o melhor local para ter um bébé, pela tecnologia e profissionais disponíveis; e os defensores do parto no domicílio vão alegar que o domícilio é o melhor local pois há menos intervenções e mais liberdade para o casal, que em primeira e última análise, já está provado em facilitar o t.p. e parto e dar experiências mais positivas aos pais. Reparem que não falei em segurança, porque para mim está equiparada. Em última análise, são os pais que têm acesso à informação que devem optar pela relação risco/benefício que mais fizer sentido para eles. 
Nalguns países do Mundo, os pais podem optar por direito e com comparticipação, por um parto hospitalar, ou num centro de partos ou por um parto assistido no domicílio (e, obviamente pelo parto não-assistido). Quando existem, as opções estão legisladas e são oferecidas às grávidas. Geralmente os centros de parto estão perto de uma maternidade no caso de problemas, ou existe uma rede de suporte e transporte nas equipas que assistem o parto domiciliar.
Por isso não concordo quando oiço dizerem: "é preciso confiar que vai correr tudo bem".
Sim, geralmente é um processo fisiológico em que quanto menos interferências houver, mais simples se torna, mas não é isento de riscos. E ter planos para essas ocorrências não é agoirar o momento. É minizar os riscos. Afinal, se podemos andar de carro com os airbags a funcionar, não é muito lógico desligá-los porque a probabilidade de ter um acidente não é assim tão alta.  Aliás, podemos observar que é essa mesma frase que é utilizada quando uma grávida ou parturiente questiona um procedimento no hospital... 
Outra frase muito ouvida é "quando os pais escolhem o parto no domicílio, são eles os plenos responsáveis pelo que acontece durante o processo". Lamento discordar, até porque é má publicidade para o parto domiciliar, mas isso só é verdade se o casal optar por um parto não-assistido. Aí sim, são eles os responsáveis plenos por tudo o que acontece do início ao fim. No caso de se estar a pagar um serviço a um profissional de saúde, há certos direitos da parte do contratante, e se este não estiver satisfeito com a forma como as coisas decorreram, pode pedir satisfações pelo atendimento prestado. Afinal, errare humanum est, e ninguém cujo dentista lhe arranque o dente errado sai de lá a dizer "a responsabilidade é minha porque fui eu que o escolhi e em última análise, deixei que ele mo arrancasse".
Por isso me faz tanta confusão que os profissionais que praticam este tipo de parto ainda não se tenham juntado para formar uma associação ou ordem que institua regras básicas pelas quais se rejam e que os defenda e defenda quem os contrata. Que não haja transparência e clareza nos preços praticados e no acesso aos profissionais disponíveis (que apenas publicitam os seus serviços por boca). Que não haja equipas duplas (2 parteiras) disponíveis para o atendimento, porque, como já li uma parteira estrangeira em entrevista: "depois do parto passamos a ter 2 clientes distintos e não apenas 1". Que não haja um sistema de backup para garantir que nenhuma parturiente fique sem parteira na hora H, por um imprevisto. Que não haja um acordo com os Bombeiros ou uma empresa de transportes para que fiquem de sobreaviso no caso de ser necessário transporte expedito para uma unidade de saúde. Que as companhias de seguros não tenham acordos de saúde que cubram o parto assistido no domicílio, visto que já foi avaliado como tão seguro como o hospitalar...

Numa época em que se fala tanto em dar o início de vida extra-uterina mais suave aos bébés (como as mais recentes evidências científicas têm demonstrado); e ao mesmo tempo, na necessidade de redução de custos na área da saúde, o reconhecimento do parto em casa ou numa casa de partos como opções válidas e seguras para as famílias ia contribuir para beneficiar em felicidade e em gestão as pessoas e o país...
Já ouvi dizer que implementar legislação ou regras ao parto domiciliar só vai trazer burocracia e transformar o parto domiciliar mais semelhante ao hospitalar... Mas a meu ver, ainda há muito a fazer pelo parto domiciliar assistido em Portugal, e não é com estagnação ou críticas destrutivas que lá vamos...
Já pari em casa e foi magnífico. 
No entanto não tenho palas nos olhos para deixar de ver que as coisas podiam melhorar...
Gostaria que todas as mulheres em Portugal pudessem escolher sem medos e restrições tanto por um parto hospitalar como por um parto domiciliar (e um dia, quem sabe, por um num centro de partos).

Boas escolhas!

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